Ontem estive presente num debate intitulado "Quanto custa a cultura?", com André Gago (actor e escritor) e Pedro Almeida Vieira (escritor e ex-jornalista) como intervenientes, na Casa da Cultura, em Setúbal.
Eis as frases e expressões que apontei no meu bloco para reflectir:
- «Optimização dos rescursos... como se houvesse mercado que faça concorrência ao Estado»;
- «Cultura ornamental»;
- «Construiu-se muita cultura de tijolo»;
- «Subsídios para os artistas não são esmola nenhuma».
«O que é isto da cultura?», questionou-se várias vezes. «E o que é ser artista? São aqueles que fazem umas coisinhas de vez em quando ou aqueles que adoptam esse exercício como profissão?», reflectiu um senhor que assistia ao debate.
Entre questões de fundo, estruturais e políticas, a conclusão que se chegou, no final deste debate, foi que a cultura está completamente desapoiada a todos os níveis. Não existem fundos monetários suficientes para o desenvolvimento das actividades culturais, não existindo por isso forma de as organizações e companhias culturais crescerem e demonstrarem mais do seu trabalho; bem como não existe grande sensibilização para a cultura na área da educação, originando produtos sem consumidores.
A cultura tem sido muito importante para o nosso país nos últimos anos. E nós, portugueses, somos muito conhecidos internacionalmente por isso. A questão é que em Portugal nem conhecemos nem usufruímos dela. Citando André Gago, não passa de uma «cultural ornamental», capitais da cultura e exposições museológicas para inglês ver como somos «ricos» em tradição, mas na prática, a cultura é o ministério que mais sofre cortes atrás de cortes e é quase inexistente nas escolas.
As duas faces da moeda: espectáculo/público. Como referido durante a sessão de debate, os espectáculos que enchem e esgotam salas são as óperas e os pavilhões atlânticos. «Não há dinheiro para ir ao teatro», mesmo quando um bilhete não ultrapassa os 5€. «Mas há pavilhões esgotados para ver dj's, a 100€ mínimos de bilheteira. O que se está a passar aqui? Porque é que a prioridade passa por ver um artista que se pode ouvir todos os dias e não acrescenta nada de novo ao saber e à crítica, e não há sequer a vontade de gastar dinheiro ou perder tempo a assistir a uma peça de teatro? Talvez devêssemos repensar. As políticas culturais (se é que existem algumas) não representam as necessidades (eu diria interesses) do nosso povo. Estas novas gerações, em que por acaso também estou incluída, foram educadas para saber interpretar literatura, pintura, escultura, teatro, cinema... mas não foram incentivados especificamente a ir ver, a ir descobrir por si próprias... Não chegou para despertar o olhar de quase todos.
E de que modo se pode fazer chegar esta sensibilização cultural às gentes mais novas (e às outras gentes também)? As autarquias têm feito um papel madrasto na ausência da mãe, o Estado. Os subsídios que transferem para os agentes culturais locais têm ajudado apenas a sobreviver. Mas muito mal. Tal como foi indicado por alguém naquela sala, a troca de subsídios para aqui e convites de espectáculos para acolá corta a receita dessas pequenas produções, que por vezes mal chega para as suportar. Se o público existente é reduzido, mas os custos de bilheteira já são quase ao preço da chuva, o que falta mais para poder construir um público interessado e diversificado em conhecimento cultural?
Um outro senhor na plateia referia o seguinte: «Nesta guerra da cultura, o artista não tem o público do seu lado. O custo da cultura é a própria vida do artista, o tempo que ele lhe dedica». E eu concordo em parte. Ou melhor, totalmente. O problema é que existem artistas e artistas, e nem todos os artistas estão na disponibilidade de fazer mais pela sua própria profissão. Se todos reconhecemos a profissão de professor, político, pescador, economista, polícia... porque não se reconhece igualmente um artista pintor, actor, escultor, bailarino, escritor?
Na televisão, aqueles que lá passam um dia, são todos muito bonitos, seja qual for a profissão. Mas cá fora, na vida real onde tudo acontece, há muitos a viverem em casa dos pais ou a passarem fome. É uma vergonha que o Estado português não reconheça e apoie os seus. É uma vergonha que profissionais não se juntem solidariamente e se apoiem uns aos outros. E também é uma vergonha que as pessoas não se mobilizem para este tipo de questões, não percebam o que está em causa e nem o que estão a perder com a viabilidade desta crise sociocultural.
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